CAPRI, C’EST PAS FINI!

Rogério Nuno Costa • Jan 07, 2020

Não acho normal que nunca ninguém me tenha perguntado o que pediria para comer se eu estivesse à espera do Fim no corredor da morte. É uma daquelas perguntas-cliché que se faz a qualquer pessoa interessada em comida. Acho eu. Os clichés a mim inspiram-me. Enerva-me quando as pessoas evitam usá-los comigo. Fartinho de responder a perguntas cuja resposta, na verdade, ninguém quer saber: se a gastronomia é ou não é uma arte, por exemplo. Chega. A sério, perguntem-me à vontade coisas do tipo “Que bolo de pastelaria és tu?”, “Para se cozinhar bem, é preciso mais técnica ou mais amor?”, “Que prato confeccionar quando ‘a’ convidas para jantar em tua casa pela primeira vez?”, ou “Gazpacho andaluz ou gaspacho alentejano?”. Sei lá, qualquer merda que dê para aparecer na Dica da Semana ou no jornal Metro, ilustrada com fotografia pixelada e uns  (risos)  pelo meio. Sim, eu gostava muito que me perguntassem pela minha “last meal”. Nunca perguntaram. Uso este meu espacinho para fazer de conta: “Rogério, diga-me, se tivesse que escolher a sua última refeição, qual seria?”. “Ora aí está uma pergunta…” Simples: tomate, mozzarella e manjericão, essa excelsa combinação que imortalizou Capri e depressa se transformou no ex-libris da gastronomia italiana. Pizzas e massas são de todo o Mundo, a  caprese  é só de Itália! Podia elencar uma ou muitas razões que me fazem gostar tanto de uma  caprese , mas o mais provável é que a estagiária do suplemento cultural da gazeta em questão tenha que cortar porque “não cabe”, ou então esquarteja-me o pensamento até só restar: “…porque é leve e saudável, sobretudo quando é feita com ingredientes super-frescos”. Ainda que a Vergonha Alheia™seja o novo avant-garde, gosto de poupar-me a certos vexames. Vamos por isso ao que interessa. Para uma  caprese  não há receita; basta olhar para a imagem e está lá tudo dito: fatias de tomate, fatias de mozzarella, folhas de manjericão, azeite, balsâmico, pimenta, sal. Agora, para uma  excelente   caprese  há alguns “truques” que posso partilhar:

  1. Tomates maduros, mas firmes, preferencialmente de cacho (os “chucha”, lol, também são fixes); escusado será dizer que fazer isto fora da  season  dos tomates é pecaminoso.
  2. Mozzarella de excelente qualidade e com a gordura toda (vi recentemente uns  low fat  numa grande superfície badalhoca qualquer e dei um grito tão grande que se ouviu no  bunker  do Belmiro de Azevedo); e depois é um pouco irrelevante se é de burra, de búfala ou de pata choca. Tem é que ser produto italiano de Itália.
  3. Tomates e mozzarella devem ser cortados em fatias com um diâmetro o mais parecido possível e sobrepostas como mostra a figura. Só assim fica bom. Se forem agora ao  Google Images  vão encontrar 30 mil variações paneleiras diferentes de empratamento — tudo merda. Escolham um prato semi-fundo, e tentem arranjar maneira de completar o prato todo e entalar tomates e mozzarella em modo sardinha em lata.
  4. Antes disso, porém, cubram o fundo com azeite (este pode ser português de Portugal, que é o melhor), balsâmico (Modena, certo?, certo!), umas pedritas de sal e outras de pimenta preta do moinho. Por razões estritamente estéticas, não gosto de atirar com vinagre para cima da salada.
  5. Manjericão: fresquíssimo. Usar as folhas INTEIRAS! (cortar aquelas que parecem grandes em duas metades é moralmente tão grave quanto esfolar um coelhinho vivo).
  6. O ponto 4. é importante sobretudo se quiserem fazer a salada com alguma antecedência. Na hora de servir, é só terminar com mais azeite. E mais sal, claro. Recomendo a flor de sal, mas não é de todo obrigatório. Só assim garantem que a salada não fica com ar de ressuscitada ao terceiro dia conforme as escrituras.
  7. Comer no fim como se fôssemos receber a injecção letal a seguir. Não sugiro nada para acompanhar; vai bem com tudo.

© Chef Rø , 2014

By Rogério Nuno Costa 14 Mar, 2020
Dois quilos de beterrabas comprados no LIDL de Hakaniemi em mega-promoção transformados em três pratos incríveis: o clássico (borscht), o moderno (hummus) e o contemporâneo (salada de beterraba, maçã & feta). Ou como passar uma semana inteira a mijar cor-de-rosa. Antes de me pôr a inventar, coloquei as beterrabas inteiras e com casca num recipiente […]
By Rogério Nuno Costa 08 Feb, 2020
Antes de começar Começo por revelar um dos meus gastro-handicaps: ODEIO todos os doces regionais que se fazem no Minho pelo Natal, com especial incidência nos mexidos ou formigos (pequeno monstro transgénico com aspecto e sabor a vómito alienígena) e na aletria (esse bloco de argamassa com sabor a água…). Esta última, creio, carece apenas de alguma customização; um dia, talvez… […]
By Rogério Nuno Costa 28 Jan, 2020
de Cogumelos c/ Creme de Cabra & Amêndoas Gostaria de começar por dizer que CANSEI de cozinhar risotto. Lamento muito desapontar as alminhas esfaimadas que nunca experimentaram os meus signature røsotto’s, mas a sério, não dá mais. Risotto está para a trendinite culinária como o dubstep (na sua versão came back) está para a música electrónica: já foi, já […]
By Rogério Nuno Costa 21 Jan, 2020
Versão française e instantânea da re-seita publicada no n.º 3 da Flanzine com o título AR DO TEMPO™. Oferta exclusiva durante o lançamento lisboeta, dia 8 de Março de 2014, no Primeiro Andar. MODO DE PREPARAÇÃO 1. Misturar o preparado em pó da saqueta pessoal e instransmissível (cerca de 5 gramas) com 3 colheres de sopa de açúcar. […]
By Rogério Nuno Costa 18 Jan, 2020
Antes de começarem com a crucificação, aviso já: não são blinis. Pronto, ganharam. E agora vamos ao que interessa. Trouxe tangerinas do meu quintal amarense para Helsínquia. Foi a loucura. Ninguém neste país sabe o que é uma tangerina, muito menos uma tangerina amarense. Agora já há uns quantos que sabem. Dois terços das tangerinas […]
By Rogério Nuno Costa 12 Jan, 2020
Não vou contar a história da bailarina delicodoce que terá inspirado esta sobremesa porque é uma seca descomunal e já toda a gente conhece, nem sequer vou tocar na polémica oceânica sobre quem é que copiou primeiro a receita. É isso e defender o gaspacho com “s” ou o gazpacho com “z”, ou se Olivença […]
By Rogério Nuno Costa 19 Dec, 2019
Lascas de bacalhau que podem ser restos de bacalhau cozido de uma refeição qualquer subtilmente refogados em azeite, alho, sal, pimenta preta, louro e cominhos. Um fio de natas batidas no fim para encorpar. Eliminar a folha de louro. Rectificação estratégica de temperos e depois reservar. Dois círculos iguais de massa folhada e picada com […]
By Rogério Nuno Costa 06 Dec, 2019
ENG: A post-modernist, post-structuralist and post-mortem gore’met recipe by Chef Rø [aka Rogério Nuno Costa] created for TELL Festival 2010, a short performance art event curated by Sérgio Marques where artists must perform in total darkness for a maximum of 10 minutes. The performance took place at the club Passos Manuel (Porto, Portugal) and consisted of a fictitious radio cooking show: […]
By Rogério Nuno Costa 05 Dec, 2019
“About The Absolute Sensuality & Other Techno-Emotional Aesthetics” is a video-installation triptych commissioned by LUPA Festival (Porto, Portugal), in which Chef Rø proclaims his “culinary-artistic manifesto” while preparing, eating and regurgitating an exquisite, yet poisonous, amuse-bouche. The piece was purposefully created for LUPA Festival (2020), hosted by La Marmita, Porto (Portugal). Concept/Performance/Edition: Rogério Nuno Costa | Text: Nuno Miguel | Thanks to: […]
By Rogério Nuno Costa 28 Nov, 2019
Menu confeccionado para o evento BOLLYFOOD™, um menu americano-indiano para o lançamento do vynil Demo, um musical Teatro Praga. Com pratos exclusivos de Chef Rø inspirados em associações livres, mas predicativas: Hindi-Winfrey-Finger-Food™ servida em modo Prop-Food™. O menu foi servido no dia 17 de Abril de 2010, no então Espaço Teatro Praga, em Xabregas, Lisboa. AMUSE-BOUCHES Crudités “Primavera” & […]
More Posts
Share by: